domingo, 30 de outubro de 2011

“Occupy Wall Street” – Brasileiros, Ocupem o Governo!



por Maria Regina Duarte
Em matéria recentemente publicada pela Revista Época, tomou-se conhecimento de que ocorreu uma reunião entre servidores da Receita Federal do Brasil e o ex-Auditor-Fiscal da mesma Receita, a do Brasil, para tratar de assuntos de alteração de legislação. A participação desse ex-Auditor, que agora defende os interesses dos clientes que representa em renomado escritório de advocacia causou estranheza entre os demais servidores da Receita. O ex-Auditor e atual consultor é pessoa bem conhecida nos bastidores do poder da Receita, já que ocupou, em período bem recente, o cargo de Subsecretário de Fiscalização do órgão, tendo sido responsável pelo planejamento e coordenação das fiscalizações dos contribuintes. Agora está defendendo, na área tributária, alguns desses contribuintes, os de maior poder econômico, financeiro, com maior influência, enfim, aqueles que podem pagar por seus competentes serviços e que estavam sofrendo autuações milionárias sobre a tributação do lucro das subsidiárias de empresas brasileiras no exterior. Mesmo no judiciário, as empresas têm acumulado derrotas e, portanto, nada mais “natural” do que discutir, dentro da própria Receita Federal, a alteração dessas normas para que essas empresas paguem menos tributos. Tudo revestido da maior legalidade e transparência, afinal, a reunião foi autorizada pelo próprio Secretário da Receita Federal do Brasil que nomeou, por portaria, os servidores que participariam da citada reunião.
Esse movimento trata-se, simplesmente, de tentar fazer com que determinados contribuintes paguem menos tributo, não interessando, por óbvio, sobre quem vai recair a conta desse não pagamento. Se sobre os ombros dos assalariados, aposentados, pensionistas, prestadores de serviços, ou sobre quem precisa dos serviços de saúde, educação e segurança do Estado.
 Nunca é demasiado lembrar que se perguntarem às pessoas se elas querem pagar mais tributos, obviamente que responderão que não. Mas se perguntarem se quem deve pagar mais tributos são as pessoas que possuem as rendas mais abastadas, as propriedades maiores, as grandes fortunas ou o capital especulativo, certamente responderão que sim. Ainda mais que é a grande maioria da população que precisa desses serviços, que são providos pela arrecadação dos tributos.
Estamos muito mal acostumados, após o colapso dos Estados comunistas e a perda dos sonhos utópicos, com a cultura do “Não Pode”, como escreve o filósofo esloveno Slavoj Zizek no prefácio à edição brasileira do seu livro “Primeiro como tragédia, depois como farsa”. “Não pode” participar de grandes atos coletivos, pois eles acabam em terror totalitário. “Não pode” defender o Estado do Bem Estar Social, porque você estará defendendo quem não quer trabalhar. “Não pode” isolar-se do mercado global, ou seja, defender a produção nacional contra o comércio internacional predatório, porque vocês estarão defendendo a ineficiência das empresas nacionais. E assim por diante.
O movimento de ocupação de Wall Street, que está repercutindo no mundo inteiro, assim como os protestos e movimentos na Espanha, Grécia, Portugal, Itália, etc., poderiam repercutir aqui no Brasil também. Se, como dizem alguns especialistas, no Brasil não haveria motivos semelhantes para fazer coro aos manifestantes de Wall Street e aos demais, do que discordo, pelo menos esses movimentos deveriam inspirar as pessoas a se engajarem num movimento de indignação.
A maioria da população não tem um consultor renomado para defender seus interesses junto às instâncias governamentais. Antes de dizermos que o Congresso Nacional, especialmente a Câmara dos Deputados, faz esse papel, devemos lembrar que lá também existem influências muito grandes dos financeiramente poderosos.
Se a ocupação não pode ser por portaria, pelo menos que seja como em Wall Street, pedindo, da mesma forma: Hei, olhem para nós.

Originalmente publicado em: Falando em Justiça Fiscal

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